segunda-feira, 16 de julho de 2012

O deus Apolo




 De todas as divindades do Olimpo, nenhuma recebeu tantas honras na Grécia antiga quanto o deus Apolo. Filho de Zeus (Júpiter) e Leto (Latona), o deus passou a ser, através dos tempos, a principal divindade cultuada pela civilização helênica. Aos poucos, várias funções foram atribuídas a ele, fazendo com que adquirisse várias faces.

Considerado a última geração dos deuses olímpicos, assume importância equiparada as do pai, Zeus, senhor dos deuses, tornando-se mais cultuado do que os tios, Poseidon (Netuno), rei dos mares, e Hades (Plutão), senhor dos infernos. Considerado o deus da luz, Apolo, aos poucos roubou as funções de Hélios (Sol), minando o culto àquele deus.

Na Grécia antiga a luz era tida como essencial para o desenvolvimento da civilização. Era através dela que se clareava a escuridão da Terra e do homem. O fogo, que transmitia luz e calor, era tido como o elemento vital na construção psicológica do homem. Tanto que foi a partir do roubo de Prometeu à chama dos deuses, que a consciência humana foi despertada. Ao dominar a luz, Apolo garantia as colheitas agrícolas, e ao iluminar a mente humana, tirava os homens das trevas da ignorância, fazendo-o triunfante diante das artes, da medicina e da filosofia. Sem a luz de Apolo, a Grécia estaria morta, perpetuada nas trevas.

 




Divindade de origem indo-européia, ao ser introduzida na Grécia, conservou grande parte das suas funções primitivas. O núcleo primitivo do mito de Apolo trazia na sua essência a explicação das necessidades primárias da vida, porque a luz garantia a agricultura e a navegação. Apolo era quem protegia a existência do homem dos fenômenos naturais que conduziam a formação de uma sociedade que sobrevivia do campo, da pecuária e do mar. Quando a civilização grega desenvolveu-se, gerando núcleos urbanos avançados, mergulhados na política e na filosofia, também Apolo adquiriu novas funções, deixando as primitivas para tornar-se protetor das artes, da medicina, da música e da poesia.

Através de Apolo, os deuses adquirem um rosto humano. O deus passa a representar a beleza e a obsessão grega em atingir a perfeição. Apolo passa a ser a imagem da beleza pretendida, infinitamente perseguida nas inúmeras estátuas que se lhe são atribuídas. Torna-se o símbolo da vitória do belo sobre o feio, do erudito sobre o vulgar, da filosofia sobre a ignorância, da luz sobre as trevas.

Conduzindo um carro puxado por cavalos presenteados por Hélios, o Sol, Apolo navega o céu, trazendo a luz aos homens. Ao lado das suas súditas, as Musas, inspira aos poetas e aos artistas, ensina aos homens a arte da medicina e, simboliza a harmonia da beleza perfeita, a essência do ideal grego.



As Múltiplas Funções Primitivas

 Leto, após ter vivido um ardente romance com Zeus, perdeu totalmente a paz. Grávida do senhor dos deuses, ela foi perseguida por Hera (Juno), a ciumenta esposa do amante. Leto andou por todos os cantos da Grécia, a fugir da rainha do Olimpo. Chegou a ilha de Delos, onde daria à luz aos gêmeos Apolo e Ártemis (Diana). Quando os deuses nasceram, a ilha antes desértica e estéril, tornou-se fértil e florida. Apolo trazia consigo a luz, a vida e a beleza.

No início da civilização grega, o fogo e a luz eram elementos considerados essenciais, vitais para o progresso humano. Sem a luz haveria apenas as trevas. Quando o culto a Apolo foi introduzido na Grécia, foi assimilado a Hélios, o Sol. Se Hélios era o próprio astro solar que pairava no céu, Apolo era a luz, o condutor do calor sobre o solo. A luz garantia a sobrevivência, a partir dela vários fenômenos eram acionados, o que levou inúmeras funções a Apolo. Na claridade, os mares poderiam ser navegados, se Poseidon era o senhor dos mares, senhor das tempestades, terremotos e maremotos, Apolo era a orientação. 

Nenhum navegante grego ousava sair ao mar sem invocar a proteção do deus solar. Apolo roubava, assim, os cultos a Poseidon. Como as ilhas gregas representavam uma força econômica maior do que as terras continentais, o culto a Apolo tornou-se mais tenaz dentro delas.
Se a luz era essencial para garantir os pastos, as colheitas agrícolas, mais uma vez os gregos invocavam a proteção de Apolo, que assumia funções da deusa da agricultura, Deméter (Ceres). A primeira colheita da primavera era dedicada a Apolo por meio de grandes festividades. Os agricultores agradeciam assim, a volta de Apolo ao mundo e o fim do inverno.


 



Uma das lendas mitológicas atribuíam o outono e o inverno ao rapto de Core (Prosérpina) por Hades, o deus dos mortos. A mãe da jovem, Deméter, não se conformou em ter a filha a morar no reino dos Infernos. Desgostosa, a deusa da agricultura abandonou a terra, que foi assolada pela fome. Para mediar a situação, Zeus ordenou que Core vivesse seis meses do ano no Érebo e seis meses no Olimpo, ao lado da mãe. Assim, quando Core voltava dos infernos, a terra florescia novamente, trazendo a primavera.

Outra lenda atribuía o inverno a Apolo, que uma vez por ano viajava para o país dos hiperbóreos, levando Hélios consigo. Na terra de homens honrados e justos, Apolo convivia feliz, ao eco dos cânticos harmoniosos dos hiperbóreos e dos seus corais de meninos. Quando terminava as férias, Apolo retornava ao mundo, e com ele voltava o sol, começava a primavera. Graças a esta lenda, era atribuída a Apolo a mudança das estações.

Assim, pastores, navegantes e agricultores, promoviam cerimônias religiosas em honra a Apolo, onde ofereciam sacrifícios ao deus. Multiplicar as colheitas, conduzir os pastores e, orientar os navegantes, eram as funções que faziam parte do mito primitivo de Apolo.







O Deus Protetor da Música e da Poesia

Em meados do século IX a.C., a civilização grega alcançava grande desenvolvimento. A luz continuava essencial na cultura helênica. Aos poucos, ela deixava de ser mitificada apenas nos atos básicos de uma civilização primitiva, para iluminar a mente avançada de um povo que se tornava sofisticado e erudito. A luz sobre a consciência arrebatava o homem das trevas, levando-lhe ao conhecimento e à perfeição diante da vida, das artes e das doenças. Apolo passou a ser o deus que iluminava a sabedoria humana.

Às funções primitivas de Apolo juntavam-se novas, muitas delas contrastavam umas com as outras. Tornou-se o deus protetor das artes e inspirador dos artistas. Passou a ser o símbolo da erudição grega, que impôs a sua cultura aos povos ao redor.

A lenda da disputa de Apolo e Mársias refletia a vitória da cultura grega sobre a cultura asiática. Para os gregos a flauta era um instrumento rude, incapaz de acompanhar as belas canções dos grandes poetas gregos, que exaltavam a epopéia dos seus heróis. A lira era considerada perfeita como instrumento, os helênicos elegiam o seu som como o mais puro, o mais harmonioso dos que se podiam produzir. A Apolo era atribuída a sua invenção. A flauta vinda da Ásia, passou a ser um instrumento a despertar o ciúme dos músicos gregos.

 


Conta a lenda que um dia, Apolo foi chamado a uma nobre assembléia no alto do monte Parnaso, local onde viviam as nove Musas, para com a sua lira, competir com um afamado flautista, Mársias, que chegara da Frigia. Da flauta de Mársias surgiu um som grosseiro e vulgar. Da lira de Apolo ouviu-se um som elevado, de harmonia perfeita e beleza irresistível. Encantadas com a lira de Apolo, as Musas declararam-no vencedor, aclamando-o deus protetor da música, da poesia e dos poetas.
Para punir a ousadia de Mársias, o frígio, Apolo esfolou-o vivo, depois suspendeu o seu corpo na entrada de uma caverna, para que todos vissem o fim de um som imperfeito e admirassem a lira grega como o mais perfeito dos instrumentos. A lenda representava a superioridade da cultura grega diante da asiática.

A associação de Apolo com as Musas passou a fazer parte do mito do deus da luz. Protetor absoluto das artes, as Musas atuavam como intermediárias do deus. Eram a elas que os poetas invocavam proteção direta. Também através das musas, os médicos invocavam a proteção de Apolo.

Deus da Medicina e dos Médicos

Com a evolução da medicina na Grécia, o deus escolhido para protetor foi Apolo. Os gregos viam os médicos como artistas que exerciam o seu talento sobre a vida humana, sobre a fisiologia do corpo.
A medicina era tida como uma arte, a saúde nada mais era do que a harmonia entre o corpo externo e a alma, entre as diversas partes anatômicas do homem e a sua mente; uma arte tão bela quanto a música. O médico era um mediador que assim como um músico, cuidava das dissonâncias que perturbavam a harmonia e beleza do corpo. Cabia a Apolo proteger à medicina e aos médicos.

 


Quando nasceu Asclépio (Esculápio), filho de Apolo e de Corônis, o deus da luz e das artes passou ao filho a atribuição de protetor da medicina. Asclépio herdou a sabedoria do pai. Educado pelo sábio centauro Quirão, logo desenvolveu a arte da medicina, descobrindo xaropes e antídotos das plantas silvestres, bebedeiras miraculosas extraídas das raízes. Preparava bálsamos que venciam graves enfermidades, e ungüentos que aliviavam as mais terríveis feridas.

A fama de grande médico de Asclépio percorreu toda a Grécia. O lugar onde vivia, Epidauro, passou a receber visitantes de todas as partes, que vinham em busca da cura dos seus males. Aos poucos, os gregos passaram a cultuar o filho de Apolo, esquecendo de Zeus, o senhor do Olimpo. 

Preocupado com o poder de Asclépio sobre a vida humana, enciumado com os cultos dirigidos a ele, temente que não houvesse mais morte entre os enfermos, o que os faria livres da proteção dos deuses; Zeus decidiu fulminar o neto com os seus raios. Para isto, pediu aos Ciclopes que o fizessem.
Como vingança, Apolo exterminou os Ciclopes, voltando a assumir a função de protetor da medicina, que tinha atribuído ao filho. Cabia ao deus não só curar, como também provocar as doenças e as pestilências.

Imagens de Apolo

O deus das artes e inspirador dos artistas, passou a ser símbolo da beleza e da busca obsessiva dos gregos em encontrar a sua perfeição. Apolo passou a ter a imagem esculpida em estátuas de belezas anatômicas perfeitas. O divino grego passou a ser representado em figuras humanas. Ao contrário das religiões antigas, que tinham deuses híbridos, em parte animal, em parte humana; ou, as semitas que não permitiam a adoração de uma imagem na forma divina, os gregos faziam dos deuses o espelho da sua imagem.

Apolo era o deus da luz, das artes e da beleza. As estátuas que lhe prestavam homenagem traziam uma beleza perfeita, símbolo do ideal grego. A inspiração era encontrada nos ginásios de atletas, onde os homens exibiam os seus corpos nus quando praticavam esportes. As estátuas de Apolo traziam uma nudez perfeita, às vezes cortada por um manto. Para que fossem esculpidas, os artistas juntavam os mais belos mancebos, selecionando de cada um a parte do corpo mais perfeita, somando o que havia de mais belo na anatomia humana.

 




Quando a obra esculpida era a do deus da luz, tudo era estudado minuciosamente, o lineamento entre a cabeça e o tronco, a perfeição do torso em comparação aos membros, a simetria perfeita entre a testa e o queixo, a cabeça e os cabelos. Juntando os dados, criavam a imagem de um deus de uma beleza ideológica, que representava o ideal perseguido pela civilização helênica em seu apogeu cultural. As mais belas estátuas de Apolo foram produzidas nos séculos V e IV a.C. , como a famosa estátua de Apolo de Belvedere, de autor desconhecido, ou a obra de Praxíteles (370? – 330? a.C.), modelada nos traços de sete belos rapazes atenienses.

Amores Impetuosos

Apolo era um deus impetuoso, ardente e constantemente apaixonado. Dentro desta impetuosidade, viveu amores sofridos e de fins trágicos, demarcando o lado humano da tragédia e das paixões.

A sexualidade grega e os seus costumes amorosos, também refletiram nas lendas de Apolo. O costume grego de recorrer à pederastia como iniciação da vida sexual, onde era considerado de profunda elevação social um homem aristocrata mais velho tomar um mancebo como amante, passando-lhe não só os segredos do sexo, como os conhecimentos culturais, militares e religiosos. O mito de Apolo serviu para que este costume fosse legitimado na sociedade grega.

De todos os deuses do Olimpo, Apolo é aquele que tem maior número de amores homossexuais. Os mais famosos foram os que ele viveu com Jacinto e Ciparisso. Com Jacinto viveu um amor intenso, depois de vencer uma disputa com Zéfiro pelo coração do rapaz. Quando praticava arremesso de discos com o amante, Apolo foi surpreendido pela vingança de Zéfiro, que soprou o disco arremessado contra o rosto de Jacinto. Ao perder o amado para a morte, Apolo transformou o sangue derramado em uma flor púrpura, com cálice em forma de lírio, a qual chamou de jacinto.

Ciparisso arremessava dardos com Apolo, quando atingiu mortalmente um cervo de estimação que lhe dera o deus. Desesperado, o jovem amante chorou incessantemente, pedindo a Apolo que jamais se lhe secasse as lágrimas. Para atender ao pedido, Apolo transformou Ciparisso em um cipreste, árvore que da sua resina formava gotículas de lágrimas no tronco.

A lenda de amor mais conhecida do mito de Apolo é a que viveu com Dafne. Ao deparar-se com a beleza da ninfa, o deus foi fulminado pela paixão. Declarou-se a ela, fez-lhe as mais ternas juras de amor, mas não atingiu o coração da bela. Solitária, Dafne jurara jamais pertencer a homem algum, fazendo um voto de castidade aos deuses. Diante do assédio de Apolo, a ninfa recusou-se a quebrar o juramento que fizera. Rejeitou o amor do mais belo dos deuses e tentou seguir o seu caminho.

 




Mas Apolo estava perdido de paixão. Não enxergava mais nada a não ser o corpo da jovem, o seu cheiro embriagador. Decidido a possuir tão delicada beleza, Apolo iniciou uma perseguição decidida a Dafne. Desesperada, ela entrou pelos bosques, fugindo sempre da impetuosidade do deus. Mas Apolo tinha a velocidade da luz nos pés, alcançando a bela ninfa. Desesperada, sem ver uma saída, Dafne implorou a Gaia (Terra), que lhe protegesse de ter o corpo deflorado por aquele amor selvagem. A deusa mãe atendeu aos clamores da ninfa. Mal Apolo tocou-lhe o corpo, sentiu-lhe a pele a enrugar, a enrijecer-se, cortada por sulcos profundos. 

Diante do silêncio súbito, Apolo percebeu que a amada tinha sido transformada em uma árvore. Desolado, o deus abraçou a árvore, a qual chamou de dafne, nome que em sua língua significava loureiro. Em homenagem à amada, declarou o loureiro árvore sagrada. As suas folhas, outrora os cabelos de Dafne, seriam usadas para purificar os sacerdotes e coroar aqueles que obtivessem grandes vitórias nas artes, nos esportes e nas batalhas.


O Símbolo do Ideal Grego

Diante da multiplicidade de atribuições que foram dadas a Apolo, a mais importante foi a da profecia. Deus da luz, que tudo via, sob a sua claridade não poderia haver mistérios. A Apolo foram erguidos os mais importantes e famosos templos da Grécia antiga. Seus sacerdotes praticavam a arte da adivinhação, vaticinando o futuro dos fiéis.

O templo de Apolo em Delfos, constituiu o maior santuário da Grécia. O oráculo recebia pessoas de todas as camadas sociais, vindas dos quatro cantos do país. Chefes militares não se envolviam em batalhas sem que pedissem orientação aos sacerdotes. Navegantes não ousavam enfrentar o mar sem que fossem aconselhados pelo oráculo do deus da luz; assim como os reis, aristocratas e pessoas do povo, procuravam desvendar o futuro e conhecer até onde poderiam ter êxito nos negócios, nos amores, nas guerras e nas viagens.

 




Através da leitura das vísceras de animais sacrificados, os sacerdotes previam o futuro daqueles que a eles recorriam, em nome de Apolo, que era quem lhes punha as palavras proféticas nos lábios. O oráculo de Delfos tornou-se o maior centro profético e de peregrinação da Grécia. A cada nove anos, os habitantes de Delfos comemoravam a mítica vitória de Apolo sobre a lendária serpente Pitão. Pessoas de todas as cidades gregas iam ao local, onde uma pomposa cerimônia revivia a luta do deus e da serpente, representando a vitória da luz sobre as trevas.

Deus da luz na essência do mito, Apolo era quem, nas suas funções primitivas, trazia as boas colheitas, cuidava dos pastores e dos seus rebanhos e orientava os navegantes quando no meio do mar. Nas suas funções de deus de uma civilização desenvolvida, iluminava os artistas, inspirando os poetas, músicos e escultores; protegia os médicos; zelava pelo equilíbrio da saúde dos homens; desvendava o futuro, profetizando-o aos que lhe prestavam homenagens e sacrifícios.Por todas as funções mencionadas, Apolo era a representação absoluta da vitória da inteligência sobre a ignorância. É o deus símbolo do que se chegou mais próximo da obsessão do ideal grego em busca da perfeição da beleza.
Fonte:jeocaz.wordpress.com

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