quarta-feira, 30 de abril de 2014

A Estrada de Damasco



A Nossa Estrada de Damasco

por Claudia Gelernter - claudiagelernter@uol.com.br

Dentre as muitas histórias envolvendo a saga dos primeiros cristãos, existe uma que particularmente toca meu coração.

Trata-se da história de vida e lutas do conhecido Paulo de Tarso - o "São Paulo", na concepção dos católicos.

Conta-se, sob a narrativa do Espírito Emmanuel, através das mãos seguras de Chico Xavier, no romance histórico Paulo e Estevão, que o então Saulo, filho de um romano e de uma judia, nasceu ha 2000 anos, na cidade de Tarso, sob o teto de uma família de posses que, preocupando-se sobremaneira com a formação religiosa de seu rebento, logo que possível o enviou aos estudos religiosos. O pequeno Saulo estava destinado à carreira de rabino e freqüentou a escola anexa à sinagoga, onde aprendeu a síntese da Lei Mosaica, desenvolvendo profundo amor às tradições, baseadas na Torá.

Tornou-se um fariseu fervoroso, defensor da Lei e dos costumes de seu povo.

Naquela época, Jesus fora condenado à cruz e ao mesmo tempo nascia, das sementes amorosas espalhadas pelo Mestre, os primeiros movimentos do cristianismo primitivo.
Quando Jesus partiu para a Pátria Espiritual, após a crucificação de seu corpo, Saulo viu-se com um grande problema a ser resolvido: extinguir aquela seita que surgia, promovedora de perturbações - ameaça à pureza judaica. Como aceitar um messias, filho de humilde carpinteiro, que convivia com cobradores de impostos e prostitutas? Como acatar aquelas idéias perturbadoras que conclamavam o amor aos inimigos? Tomado por idéias aquecidas pelo fogo de sua fé cega, passou a perseguir cristãos, como se estes fossem seus inimigos. Sob a pressão de suas convicções e o apoio de seus pares, mandava apedrejar indivíduos que se negavam a abjurar seu Mestre. Foi assim que, dentre outros, condenou Estevão à morte por lapidação: um homem de profunda sabedoria, que foi conduzido ao apedrejamento carregando espantosa paz íntima.

A cada dia ainda mais rígido, mais dogmático, decide perseguir o cristão Ananias, na cidade de Damasco, que ali trabalhava pregando o Evangelho. Saulo, acompanhado por alguns companheiros, toma o rumo da capital Síria. Parte de Jerusalém, com o coração contraído pelas lembranças difíceis dos últimos tempos. Forte angustia assomara seu espírito. ‘Qual a força misteriosa que move os cristãos, que os faz tão serenos, apesar de nossas buscas? ‘Como conseguem esta paz, diante de tantas provas?

Saulo seguia pela estrada, como muitos de nós nos tempos atuais que, embora fortalecidos pela fé em um Ser Superior, em alguns momentos da existência,  perdemos o "rumo".

 



* * *

Todos fomos criados com uma espécie de chip de perfectibilidade,  com o objetivo maior de chegarmos ao nivel dos Espiritos Puros, e a rota segura para atingirmos este alvo nos chega através das revelações divinas, trazidas pela Espiritualidade ao longo da história humana. Quando derrapamos no caminho, nosso alarme interno soa em forma de dor física ou moral - ou ambas. É como se a angustia fizesse morada em nosso coração [e em alguns momentos sem motivo aparente].

Era o que acontecia com Saulo naqueles tempos. Desejava ardentemente servir a Deus, mas se distanciava de seu objetivo quando perseguia seus irmãos do caminho.

Angustiado, tomou a estrada de Damasco.

Aqui cabe uma pergunta: - Quantos de nós ainda permanecemos na Jerusalém da ilusão material, sem nos incomodarmos com os desvios do caminho? Quantos nos mantemos desconectados de nosso mundo íntimo, por pura comodidade, preguiça, negligenciando aquilo de que realmente precisamos?




 

* * *
 

Saulo, angustiado, seguiu pela árida estrada quando, às portas de Damasco, e,  no auge de seus questionamentos íntimos, viu Jesus à sua frente. A visão era tão bela, tão forte que não conseguiu manter-se sob o cavalo, caindo no chão.

- Saulo!... Saulo!... por que me persegues? Perguntou o Mestre.
O rabino, atônito, sem forças para responder a dolorosa pergunta, questiona:
- Quem sois vós, Senhor?- Eu sou Jesus!...
Então, o poderoso fariseu curvou-se ao solo, aos prantos. Compreendeu a verdade naquele momento. Estêvão estava certo. Os cristãos estavam certos.
De sua conversão instantânea surge, então, apenas uma última pergunta:
- Senhor, o que quer que eu faça?

Nada de desculpas, nada de pedidos e dúvidas. Ele estava ali, pronto para seguir o chamado. Foi como se, de repente, diante de seu Espírito desorientado, aparecesse o roteiro preciso. Eis que a fé tomou, então,  o rumo certo.  Jesus lhe pede que vá para Damasco e que aguarde novas instruções.
 
Saulo, logo após perceber a figura materializada do Mestre, fica cego. Mas isso não lhe impede de ir ao encontro de seu destino, em Damasco. Fechara-se a luz para os olhos do corpo, porém, uma nova luz começava a ser percebida pelos olhos do Espírito.
Seguiu para a cidade e, estando em uma hospedaria, recebeu Ananias, [o mesmo homem que antes perseguia] que, num instante repleto de simbolismo, estendeu as mãos sobre suas vistas, devolvendo ao novo homem, agora lúcido do Espírito, a visão do corpo.

Creio que trilhar a nossa estrada de Damasco é, entre outras coisas, encontrar-se com a fé, com o retorno aos propósitos maiores de nossa existência. É fechar os olhos do corpo para abrir os olhos do Espírito - o voltar-se para dentro de si, fechando-se para os apelos materiais.
É, ainda, e sobretudo, conversar com a dor, com a luz, consigo mesmo, para, então, buscando entender as mensagens que nos chegam, retomar os passos, seguindo adiante, com outras disposições.

Desejo sinceramente que você encontre sua estrada de Damasco e que, estando nela, encontre a paz. E que, estando em paz, possa ser fonte de bênçãos para todos aqueles que cruzarem teu caminho, servindo de exemplo para os viajantes momentaneamente perdidos. 


Fonte: http://somostodosum.ig.com.br

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