Antigamente,
havia um Estado chamado Hua Xu Shi situado ao Noroeste da China, era
sulcado por um largo e sinuoso rio, chamado pelos habitantes que viviam
nas suas margens de rio do Trovão.
Mas, por
que lhe chamavam, eles rio do Trovão? Segundo conta a lenda, a nascente
deste rio era o lago do Trovão - um grande lago onde vivia o deus do
Trovão, um ser inconstante que passava de uma enorme alegria para uma
fúria completa.
Assim, também o rio mudava de caráter de acordo com os
caprichos do deus, as vezes correndo tranquilo com a superfície das suas
águas mansas, tal como um espelho, brilhante onde se refletiam as
varias paisagens de ambas as margens e, outras vezes, convertendo-se
subitamente em um avassalador caudal, destruindo casas, alagando
plantações e arrastando tudo em seu redor - os rugidos da sua impetuosa
corrente faziam um barulho ensurdecedor e a terra tremia. Então, o povo
dessas paragens compreendia que o deus do Trovão estava em cólera.
Assim, o
rio do Trovão continuava provocando calamidades ano apos ano, sem que
ninguém soubesse o que fazer e sem ninguém que se atrevesse a pedir uma
audiência ao deus do Trovão implorando-lhe que partisse do lago do
Trovão de volta para o Céu. Ora, na margem do rio do Trovão vivia um
casal de anciãos com uma única filha chamada Hua Xu. Ela era uma jovem
tão inteligente e bonita como corajosa e bondosa mas, como todas demais
filhas únicas, acostumada a fazer sempre as suas próprias vontades.
Um dia, o
deus do Trovão ficando mais furioso que nunca, provocou uma terrível
inundação. O casal de anciãos disse, suspirando: - Oh, mas quando irão
terminar estas calamidades?!
As inundações voltaram a arrasar nossas casas recém-construidas e a engolir todos os nossos gados.
- É preciso que alguém vá ao lago do Trovão protestar contra este maldoso deus! - disse Hua Xu indignada.
- Mas,
minha filha - retorquiu o canal, abanando desconsoladamente as suas
cabeças - o deus do Trovão é um tirano e o melhor é não nos atrevermos
irritá-lo!
- Como
todos os outros deuses celestes, o deus do Trovão deveria igualmente
viver no Céu. Por que está ele na Terra provocando calamidades aos seres
humanos?! Vou é discutir com ele! - declarou a filha, decididamente.
- Não
sejas teimosa, minha filha! Já se passaram muitos anos, mas até a data
ninguém jamais se atreveu a ir ao lago do Trovão. E, tu, tu... -
replicaram-lhe os Dois, tentando persuadi-la.
A jovem
permaneceu silenciosa mas, pelos seus lábios apertados e o enérgico
olhar fixo, os pais puderam adivinhar que ela já tinha tomado a sua
decisão.
Assim,
poucos dias depois, Hua Xu deixou a sua aldeia e os pais e começou a
caminhar pela margem acima do rio do Trovão em direção a sua nascente.
No caminho colheu frutos selvagens com que mitigou a sua fome e matou a
sua sede bebendo água do rio sempre caminhando, caminhando sem parar. Ao
fim de vários dias apareceu-lhe subitamente pela frente um imenso lago
de profundas aguas negras - era o lago do Trovão. A jovem debruçou-se
observando as temíveis Aguas quando, de repente, irrompeu de entre ondas
altas e impetuosas um monstro de rosto humano e corpo de dragão.
Assustada,
Hua Xu recuou uns passos e escondeu-se detrás de uma grande arvore,
mas, inadvertidamente pisou em uma grande pegada e sentiu-se transfixa
em uma posição imóvel.
- Como te atreves a vir à minha divina residência! - falou o monstro em uma voz de Trovão.
E, sem
mesmo esperar uma resposta da jovem, o deus Trovão saltou fora das aguas
para a margem do lago e, apanhando a jovem, levou-a nos braços para o
seu palácio no fundo do lago.
Embora
amplo e grandioso, o palácio do deus do Trovão era despojado de
mobílias. Em um trípode estava pendurado um grande tambor e, ao lado
deste, estava reclinada uma gigantesca baqueta, sendo estes os
instrumentos com que o deus provocava trovoes. Quando, frequentemente,
viajava voando para o Céu tocava o seu tambor, ouvindo-se em simultâneo o
ribombar dos trovões na Terra. Por vezes, quando ficava bêbado, também
tocava este tambor no seu palácio dando então lugar a impetuosas ondas,
tanto no lago como no rio, o que causava graves calamidades.
- Como te atreves a vir a minha divina residência?! - repetiu o deus a sua pergunta.
- Vim
aqui para discutir contigo! - respondeu-lhe a jovem em um tom tranquilo.
- Tanto o Imperador Celestial como os deuses do Vento, dos Relâmpagos e
todos os demais vivem sempre no Céu. Gostaria que me explicasses por
que e que tu insistes em estabelecer a tua residência aqui na Terra?
- Porque... porque me apetece! - replicou confuso o deus do Trovão em um ar arrogante.
- Mas,
sabes porventura, que tens vindo a causar desastres consideráveis aos
habitantes que moram nas margens do rio do Trovão? - retorquia a jovem
mostrando-lhe a sua indignação.
Perante
as palavras argumentativas de Hua Xu, o deus do Trovão, apesar da sua
crueldade e violência, não conseguiu encontrar nenhuma replica imediata,
admirando antes a coragem da jovem e sentindo-se ficar arrastado,
apaixonadamente, pela sua presença.
- Então,
esta bem! Em breve partirei de novo para o Céu; no entanto, ponho uma
condição: quero que aceites ser minha esposa. De qualquer maneira, já
não tens quaisquer possibilidades de regressar a tua terra natal -
disse-lhe o deus do Trovão a meia voz. Admirada, a jovem quedou-se
pensativa com um ar hesitante e o deus do Trovão aproveitou para
acrescentar em um tom suave:
- Fica tranquila que daqui para diante tratar-te-ei como mereces.
Ao ver
que o deus do Trovão tinha aceitado cumprir o que ela lhe pedia, Hua Xu
decidiu casar-se com ele; este, a partir de então, passou a trata-la
sempre com a maior das bondades e desvelos e, contendo-se de soar o
tambor desnecessariamente, o lago e o rio passaram a ter uma serena
tranquilidade.
Um ano
depois, Hua Xu deu à luz um filho e o deus do Trovão preparava-se para,
definitivamente, regressar ao Céu conforme tinha prometido, acompanhado
pela mulher e pelo filho. Mas, Hua Xu, pensando na sua próxima partida,
começou a ter fortes saudades da sua terra natal e dos pais. Decidiu
que, como ela mesma nunca mais haveria de ter possibilidades de
regressar ao mundo, pelo menos o seu filho deveria crescer no Estado de
Hua Xu Shi.
Assim,
um dia, aproveitando um momento em que o deus do Trovão se tinha
ausentado, a jovem colocou a criança dentro de uma grande cabala,
colocando depois esta no rio e deixou-a ser levada pela corrente.
Aconteceu
que nesse dia, o pai da jovem se encontrava pescando no mesmo rio e,
com o passar do tempo, fitando as aguas que corriam mansas, o ancião
sentindo-se saudoso da filha, começou a chorar copiosamente quando
reparou que, arrastada pelas forças das aguas, se aproximava dele uma
grande cabala.
Estranhando
as suas dimensões, o ancião retirou-a do rio e levou-a para casa onde
se decidiu a enceta-la a sua mulher. Mas, assim que o casal a talhou,
saiu de dentro desta uma rosada e anafada criança envergando uma camisa
bordada de flores.
Seguidamente,
examinaram detalhadamente os traços da criança que com a sua larga
testa, a sua alva pele e as suas bem pronunciadas sobrancelhas escuras,
era extremamente semelhante a sua filha. Não havia nenhuma duvida de que
o imberbe era o seu próprio neto!
Este
inesperado acontecimento veio dar uma grande paz-de-alma aos anciãos que
tinham ficado com o coração dilacerado, primeiro, com o afastamento da
sua única filha e depois com a ausência de noticias. O inesperado
acontecimento propagou-se de boca em boca e, tendo vindo muitas pessoas
felicita-los e para recordarem o auspicioso aparecimento do neto, os
avos deram-lhe nome de Fu Xi, significando que tinha sido oriundo de uma
cabala.
Fu Xi,
filho do deus do Trovão e da jovem Hua Xu, cresceu rapidamente e em
breve se distinguiu, consideravelmente, das demais pessoas pela sua
altura gigantesca, inteligência e bravura, mas o mais extraordinário era
que Fu Xi tinha o poder de subir ao Céu pela "escada celeste".
Segundo
uma lenda dos tempos mais remotos, a Terra e o Céu estavam ligados por
uma gigantesca árvore chamada Jian Mu que, colocada no centro da Terra,
era como uma "escada" natural. Esta arvore, ao contrario de todas as
outras, não produzia sombra sob os raios do Sol e, ao longo do seu
tronco, caíam milhares de lianas biparas em forma de cordas que
constituíam a "escada celeste", por onde os deuses desciam do Céu a
Terra e vice-versa. No entanto, os seres humanos não tinham a habilidade
de subir ao Céu por esta "escada". Fu Xi, sendo filho de um deus, podia
subir e descer facilmente por ela.
Fu Xi
amava muito a pátria onde tinha crescido e o seu povo, com quem tinha
convivido desde criança. Graças a sua inteligência sobrenatural ele
tinha contribuído, de inúmeras maneiras, para o seu progresso, tal como:
ter inventado um habilidoso método de fazer redes de pesca inspirado
pelas teias das aranhas, ter introduzido a preparação dos alimentos a
quente refutando uma dieta frutívora - os seus companheiros chamando-o,
respeitosamente, de Bao Xi, que significa "o melhor cozinheiro" - etc. A
maior das suas contribuições foi, no entanto, a criação dos Oito
Trigramas que representam os oito estados da natureza:
(Qian) o céu;
(Kun) a terra;
(Kang) a água;
(Li) o fogo;
(Gen) a montanha;
(Zhen) o Trovão;
(Xun) o vento;
(Dui) o lago.
Fu Xi explicou aos seres humanos a essência de todos os aspectos universais contidos nos Oito Trigramas e as inter-relações entre estes. Se os humanos aprendessem a dominar as características, relações e conversões entre os aspectos universais implícitos nos Oito Trigramas e controlassem as suas respectivas funções, estes poderiam, tal como os deuses, evitar muitos dos prejuízos causados pelas calamidades naturais e utilizar corretamente todas as coisas ao serviço do progresso e harmonia de todos.
Segundo
uma lenda, no processo de domar as aguas, Da Yu tinha antevisto uma
grande e escura gruta no monte da Porta-do-Dragão e querendo conhecer
detalhadamente o seu interior, tinha entrado nela empunhando um archote
quando, de repente, das suas profundezas lhe surgiram dois grandes
ursos. Um deles agarrava na sua boca uma perola reluzente que iluminava o
interior da gruta tal como se fosse pleno dia, enquanto o outro acenava
com a cabeça em direção ao exterior dando a entender a Da Yu que os
seguisse.
Depois de caminharem cerca de Dez Li Da Yu chegou a
frente de um palácio e, no momento em que ele estava surpreso por tal
aparição, os dois ursos transformaram-se em dois guardas envergando
uniformes pretos pondo-se de sentinela. No centro do salvo principal do
palácio estava sentado um deus com face humana e corpo de dragão, que Da
Yu imediatamente reconheceu não ser outro senão Fu Xi, o filho do deus
do Trovão e da jovem Hua Xu. Da Yu saudou-o então respeitosamente, e
pediu-lhe que desse o seu parecer sobre a melhor maneira de dominar as
águas ao que Fu Xi, ficando muito honrado por tal intercessão, lhe deu
uma placa de jade na qual se encontrava gravado o plano de Oito
Trigramas.
- Para
se dominar as águas - desse-lhe Fu Xi - é preciso conhecer-se bem a
topografia das montanhas e dos rios assim como os níveis das águas e dos
terrenos. Não basta arrasarem-se montanhas deixando livre a passagem
das correntes, escavarem-se terras para se drenarem as águas ao mar ou
construírem-se cliques e pontes; é preciso conhecer-se as suas
respectivas e intrínsecas características. Só através do conhecimento
destas e pondo em prática os seus princípios básicos, Segundo o que
est[a prescrito na placa de jade e de acordo com as indicações do plano
de Oito Trigramas, as águas serão dominadas e a humanidade será salva da
sua miséria.
Assim,
graças aos Oito Trigramas, Da Yu conseguiu definir as topografias das
montanhas, dos terrenos e dos rios e dominar radicalmente as águas.
Segundo
uma outra lenda, muitos anos depois, na época da Dinastia Yin, quando o
soberano despótico Zhou ocupava o trono, um seu ministro chamado Ji
Chang (posteriormente eleito rei com o nome de Zhou Wen Wang)
apresentou-lhe, respeitoso, um construtivo criticismo a proposito da
tirania das suas ações, tendo por isto sido preso pelo monarca e
encarcerado em Youli.
Aproveitando o tempo solitário desses dias
angustiados, o ex-ministro dedicou-se ao estudo dos Oito Trigramas e,
combinando as suas próprias experiências com os preceitos dos
princípios, veio a estabelecer uma serie de ensinamentos ainda mais
profundos. Ao anotar estes ensinamentos em anexo ao plano dos Oito
Trigramas, compilou assim O Zhouyi (Livro sobre as Mudanças) fazendo com
que os futuros estudiosos compreendessem melhor as diversas mudanças da
natureza e da sociedade.
Tomando
em consideração as grandes contribuições de Fu Xi em relação ao
bem-estar futuro da humanidade, o Imperador Celestial nomeou-o rei do
Estado de Hua Xu Shi. Graças as suas capacidades sobrenaturais, ao seu
enorme talento e as imprescindíveis ajudas dos seus valiosos ministros, o
governo de Fu Xi trouxe grande prosperidade ao pais.
Ju Mang, o seu
ministro da agricultura, era um ser de rosto humano e corpo de ave,
extremamente competente e altamente respeitado pelo povo. Todos os anos,
no principio da primavera, ele voava pelos quatro cantos do globo,
medindo as terras a serem cultivadas e mobilizando pessoas para as
lavrar e semear - tendo por isso ficado conhecido como o deus da
primavera.
As pessoas viviam, também, até uma adiantada idade, muitos anciãos tendo mais de 100 anos. Neste paraíso terrestre as águas não afogavam os mortais, nem o fogo os queimava, nem as brumas e as nuvens lhes toldavam a vista, nem os trovoes lhes prejudicavam os ouvidos; podendo estes, inclusive, atravessar as montanhas e os rios com a mesma facilidade com que se deslocavam nas planícies.
Graças ao entendimento total do plano dos Oito Trigramas de Fu Xi, os habitantes do Estado de Hua Xu Shi conseguiram possuir capacidades sobrenaturais e assim levarem uma vida ideal. Mesmo nos tempos atuais aqueles que se dedicam ao estudo dos Oito Trigramas tem vindo a afirmar que muitos dos conhecimentos adquiridos através destes, podem inspirar as pessoas a conhecer melhor e dominar mais seguramente as leis da natureza.
Fonte: http://www.mitologia.templodeapolo.net/
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