A matéria é deteriorável, o espírito é imortal.
Vladimir Polízio
A doação de órgãos e a cremação são dois pontos que geram controvérsias. A intenção deste trabalho não é fazer apologia a procedimentos que envolvam decisões delicadas. A questão da doação de órgãos tem deixado muitas pessoas inquietas e sem disposição alguma para falar sobre o assunto, considerado como “tabu” em certos lares. Evitam, ao máximo, a participação nessa incômoda conversa.
Por outro lado, quando alguém sabe da necessidade de se sujeitar a delicada cirurgia e a conseqüente precisão de se substituir determinado órgão do corpo humano, para que haja o retorno do equilíbrio ao sistema, o paciente ou a própria família não vê a hora que esse “inferno” termine. Não é só isso. Quando consegue alcançar o objeto pretendido, não sabem ou não encontram palavras para o devido agradecimento, tamanha a alegria que invade o sentimento de todos.
“Graças a Deus”, muitos dirão. Mas, para que a felicidade de fato aconteça desse lado, é preciso que, na outra ponta, a tristeza e a dor se façam presentes e ainda por cima a disposição em ceder.
Até há alguns anos, era obrigatória a inserção na carteira de motorista (CNH) informação se o condutor era doador ou não de órgãos. Ali, nesse documento que substitui a carteira de identidade em algumas situações, estava demonstrada a patente e manifesta intenção do primeiro responsável por tal atitude, que é a própria pessoa. Aliás, nesse sentido, muitos familiares, próximos inclusive, se surpreendiam quando eram informados sobre a vontade expressa no documento, por ocasião do atendimento do acidente quando se constatava o óbito.
Hoje, como essa medida não é mais usual, muito se perde, pois os familiares, com rara exceção, não se manifestam, mesmo quando consultados. Do outro lado, filas gigantes de espera se contrapõem à oferta. Portanto, jamais se faria discussão sobre isso. Cada um deve decidir, e sempre, amparado no sagrado direito do livre-arbítrio.
A par dessa questão da doação, caminha outro problema que, aos poucos, vai criando espaço e consistência junto à população. Bem sabemos que inúmeros são os países europeus e asiáticos que adotam o sistema da cremação. Embora essa prática não seja ainda muito aceita no Brasil, de acordo com o Crematório de Vila Alpina, na Capital paulista, a cada três ou quatro meses há necessidade de se rever o percentual de interessados nessa modalidade de procedimento, em razão do crescente interesse demonstrado.
Como os números não mentem, mesmo aproximados, somente na capital de São Paulo temos em média o registro de 300 óbitos diários. Desse total, cerca de 25 deles são encaminhados ao crematório, o que corresponde a 8%. Isso está significando maior aceitação, mesmo porquê outras cidades do Estado de São Paulo já estão em atividade nessa área, como Guarulhos, Santos, São José dos Campos, Sorocaba, Taboão da Serra e Itapecirica. São José do Rio Preto e Santo André estão em fase de preparação. Enquanto outros países têm número elevadíssimo de cremações, o Brasil conta com 3.400 óbitos por dia sendo que apenas 100 desse total são encaminhados para esse sistema, somando cerca de 3%.
Hoje, a justificativa para essa opção está contida num pacote com vários argumentos, conforme alegam. O primeiro deles é o custo com operação de aquisição de jazigo, inumação e sua perpétua manutenção. Mesmo pela ótica Espírita, há que se considerar, primeiramente, a formação individual. O aspecto da educação cultural é muitíssimo importante. O desprendimento é o fator fundamental para a tranqüilidade de qualquer decisão a ser tomada nesse sentido.
Por um lado, a questão 151 de “O Consolador”, através de Emmanuel, essa figura exponencial que acompanhou Francisco Cândido Xavier na condição de Mentor por quase 75 anos, afirma que devemos aguardar por mais horas o ato de destruição das vísceras materiais, em razão de possíveis ecos que ainda possam existir, cujos fluidos solicitem a alma para as sensações da existência material.
De outra parte, temos “O Céu e o Inferno”, em sua segunda parte, 1º capítulo – A Passagem. Nos tópicos “4” e “5” vamos encontrar “… de sorte que a separação não é completa e absoluta senão quando não reste mais um único átomo do perispírito unido a uma molécula do corpo; disso resulta que o sofrimento que acompanha a morte está subordinado à força de aderência que une o corpo e o perispírito”.
Quanto à perturbação, no tópico “6” vemos: “a perturbação pode, pois, ser considerada como normal no instante da morte; a sua duração é indeterminada; varia de algumas horas a alguns anos”.
Porém, nos casos de morte natural ou doenças, no tópico “9” aborda-se da seguinte forma: “no homem, cuja alma está desmaterializada, e cujos pensamentos se separam das coisas terrestres, o desligamento é quase completo antes da morte real; o corpo vive ainda a vida orgânica e a alma já entrou na vida espiritual e não se prende mais ao corpo senão por um laço tão fraco que se rompe, sem dificuldade, ao último batimento do coração”.
Na morte violenta, contudo, o tópico “12” esclarece: “Sendo a força da vida orgânica subitamente detida, o desligamento do perispírito não começa, pois, senão depois da morte, e, nesse caso, como os outros, não pode se operar instantaneamente. O Espírito, apanhado de improviso, está como atordoado”. “O Livro dos Espíritos” esclarece na questão 155a: “… a alma se liberta gradualmente… os laços se desatam não se quebram”.
Para finalizar, o tópico “13” traz: “… a prontidão do desligamento está em razão do grau de adiantamento do Espírito; para o Espírito desmaterializado, cuja consciência é pura, a morte é um sono de alguns instantes, isenta de todo sofrimento e cujo despertar é cheio de suavidade”.
À vista de todo o exposto, compreendemos que para quaisquer dos casos de desencarnação, seja através de morte violenta ou natural, há que se ter, sempre, leveza de espírito e de coração, pois foi Jesus que o disse: “Vigiai, porque não sabeis em que dia vem o vosso Senhor. Mas considerai isto. Se o pai de família soubesse a que hora viria o ladrão, vigiaria e não deixaria que fosse arrombada a sua casa. Por isso ficai também vós apercebidos, porque, à hora em que não cuidais o Filho do homem virá” (Mateus, 24, 42-44).
Há que se pensar bem, para não se arrepender das atitudes tomadas. Como compreenderíamos aqueles que são lançados ao mar? Como ficariam os que se perdem nas geleiras eternas? E os que nunca foram encontrados por razões diversas? Através dos próprios Espíritos, nos é esclarecido que o corpo é mero veículo, é móvel de ação da Alma, é matéria deteriorável; sem o halo vital é, de fato, verdadeiro resto. “Deixai que os mortos enterrem seus mortos”.
Fonte:duplavista.com.br
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